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Muitas vezes, quando estou fazendo pesquisa sobre legislação ou sobre jurisprudência na internet, lembro dos tempos em que a consulta das leis e dos julgados era feita em livros – a doutrina jurídica clássica permanece nos livros impressos. Nessa época, quando estava na Price Waterhouse (ainda não havia o Coopers), nossa heroína foi a bibliotecária que, à mão, anotava nas leis as referências das suas alterações, indicando o volume daquela coleção onde poderíamos encontrar o texto da nova norma.
Com certeza, a evolução das comunicações e da informática, que juntas pariram a internet, transformou significativamente o mundo (o que é quase um clichê). Essa transformação foi muito bem apropriada pelas autoridades fiscais brasileiras, que logo se movimentaram para adquirir um supercomputador e desenvolver um programa de controle das transações, de pessoas jurídicas e de pessoas físicas, que flerta com a perfeição. Esse programa atende pelo nome de Sistema Público de Escrituração Social (Sped), com suas escriturações digitais: desde a nota fiscal, passando pela contabilidade e pela apuração dos tributos.
Nesse contexto, é natural que o contato com os contribuintes seja, da mesma forma, virtualizado. Assim, devemos caminhar passiva e inevitavelmente para a relação entre Fisco e contribuinte por meio do correio eletrônico. Afinal, qual foi a última carta que escrevemos em papel e enviamos pelo correio físico numa relação comercial, profissional ou familiar (ressalvadas as malas diretas), certo? Errado.
Inicialmente, importa relembrar a importância do domicílio fiscal, que se presta, basicamente, a duas funções, ambas como garantia da relação entre Fisco e contribuinte: identificar a norma tributária aplicável, considerando que ela guarda limites territoriais; e ser encontrado pela máquina de cobrança dos tributos, seja na esfera administrativa seja na esfera judicial.
Para a primeira das funções mencionadas, por enquanto, na maioria dos casos, ainda não é possível virtualizar o domicílio fiscal – frise-se, por enquanto... Quanto à segunda, existe à disposição o correio eletrônico ou e-mail. Portanto, a adoção do e-mail para finalidades tributárias está sujeita às regras de domicílio fiscal.
A regra principal (e geral) sobre o domicílio fiscal, nos termos da lei tributária maior (Código Tributário Nacional – CTN), determina que o contribuinte tem a faculdade, a opção de optar pelo local do seu domicílio. A decisão do contribuinte nessa matéria somente pode ser afastada no caso de evidente embaraço à cobrança tributária. Por consequência, cabe ao contribuinte escolher se pretende ou não se relacionar com o Fisco por meio do seu correio eletrônico.
Acontece que o controle eletrônico da administração tributária, particularmente em âmbito federal, vem exigindo a “opção” do contribuinte pelo contato virtual com o Fisco para dar prosseguimento a essa relação. A última dessas investidas foi a exigência da concordância em receber intimações e comunicados da Receita Federal por meio do e-mail para que o contribuinte possa aderir ao chamado Refis da Copa. Uma evidente ilegalidade.
A faculdade de escolher seu domicílio é, por si só, uma garantia do contribuinte, para que não seja tomado de surpresa por questões tributárias. Tal garantia deve ser redobrada no caso do contato virtual, visto que ele está sujeito a diversas intempéries, como problemas no servidor da Receita Federal ou no servidor do contribuinte, diferenças de configuração, informações sem aviso adequado e muitas outras “chuvas e trovoadas”, por vezes, literalmente.
Conquanto pareça inevitável, o contribuinte deve ter cautela no trato do seu domicílio fiscal, redobrando a atenção no caso da “opção”, espontânea ou forçada, pelo e-mail. Quer de maneira preventiva quer de maneira a remediar eventual futuro prejuízo.
Fonte: Valor Econômico
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