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A expansão da economia favorece a legalização das atividades
André Franco Montoro Filho
Um importante e inovador índice tem sido elaborado pelo Ibre/FGV por solicitação do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco). Esse índice é uma estimativa da magnitude da economia subterrânea no Brasil, entendida esta como toda a atividade não registrada junto às autoridades competentes. Sua atualização divulgada no fim de novembro passado indica que a importância das atividades ilegais na economia brasileira, que vinha se reduzindo desde 2003, parou de cair nos últimos anos.
Os dados mostram que, de 2008 a 2010, a participação das atividades econômicas não registradas se manteve no patamar de 18,6% do Produto Interno Bruto (PIB). Ora, como nesse período houve expressivo crescimento econômico, essa estabilidade significa que as atividades ilegais também registraram acentuado dinamismo. O que pode explicar esse fenômeno?
O crescimento econômico impacta a economia subterrânea de duas formas antagônicas. Em primeiro lugar a modernização institucional que acompanha o desenvolvimento econômico tem um efeito moralizador favorável à legalização de atividades. Por exemplo, o crescimento da intermediação financeira, seja por meio de empréstimos, seja via mercado de capitais, estimula a formalização de empresas e indivíduos. A concessão de crédito requer documentos para análise de garantias, o que exige de empresas e indivíduos o registro formal de suas atividades. Da mesma forma, o crescimento da importância do comércio exterior na economia brasileira, importações e exportações favorece a formalização, pois esse comércio, por sua própria natureza requer extensa documentação das transações comerciais. Tanto os montantes de crédito como o volume de comércio internacional cresceram vigorosamente nos últimos anos, o que deve ter sido um forte estímulo para a redução da informalidade.
Existe, entretanto, outro impacto do crescimento econômico sobre a economia subterrânea. É o efeito renda ou demanda. Quando há crescimento da renda há crescimento da demanda, seja por bens produzidos pela economia registrada, como pelos produzidos pela economia não registrada. O forte crescimento da economia subterrânea observado nos últimos anos indica que esse efeito renda tem sido maior que o efeito moralizador gerado pela modernização institucional. O que pode explicar essa predominância?
Uma importante vantagem da economia subterrânea é sua grande flexibilidade e agilidade. Não respeitando as exigências impostas pelas diversas regulações existentes para as atividades formais ela fica livre das burocracias legais e pode assim responder rapidamente às variações na demanda por seus produtos. O imediato aparecimento de ambulantes vendendo guarda-chuvas quando começa a chover testemunha a rapidez de resposta das atividades informais ao crescimento, ainda que no caso pontual, da demanda.
Os vendedores de guarda-chuvas quando começa a chover são a prova da rapidez de resposta do setor
Essa velocidade de ajuste é uma vantagem inerente das atividades que não respeitam a legislação. Mas essa vantagem é amplificada pela excessiva e crescente burocracia que tem caracterizado, ao longo do tempo, a economia brasileira. Recente pesquisa publicada pelo Banco Mundial sobre a facilidade de fazer negócios em 183 países (Doing Business 2011) coloca o Brasil entre os que mais requerem procedimentos burocráticos para o desenvolvimento de atividades produtivas. E pior, o Brasil perdeu posições em relação à pesquisa anterior de 124ª para 127ª.
Um item desta pesquisa tem clara relação positiva com o tamanho e com o crescimento da economia subterrânea no Brasil: é o tempo gasto para pagar impostos. Neste quesito o Brasil é campeão mundial da burocracia. São necessárias 2.600 horas por ano para pagar tributos. O vice-campeonato ficou com a Bolívia: 1.080 horas. Para dar inveja, na Suíça são necessárias apenas 63 horas por ano. Ninguém gosta de pagar impostos, pois do contrário não seriam impostos e sim voluntários. Se a essa predisposição negativa ainda se acrescenta este enorme tempo e um sem fim de dificuldades para cumprir as obrigações fiscais, é até surpreendente que a sonegação fiscal não seja ainda maior no país. Resta assim explicada a grande resistência da economia subterrânea aos esforços dispendidos, em particular os de modernização da arrecadação e da fiscalização tributárias, para reduzir a magnitude ou, ao menos, diminuir o crescimento da sonegação no país.
Não restam dúvidas que o elevado valor dos tributos vigentes no Brasil é um forte estímulo para a ilegalidade e informalidade. Entretanto e sem prejuízo de uma desejada menor carga tributária, a redução e a simplificação de exigências e procedimentos burocráticos para o pagamento de obrigações tributárias se afiguram como prioritárias para aumentar a competitividade sistêmica da economia brasileira e para a diminuição da economia subterrânea. O cipoal de regras e exigências fiscais e administrativas em permanente estado de mutação é o grande tormento dos contribuintes. As empresas são obrigadas a manter equipes e contratar especialistas apenas para ficarem em dia com tantas mudanças nas obrigações, sejam elas as obrigações principais e especialmente as obrigações acessórias.
Nesta direção, a solução do problema é simples. Basta proibir tantas mudanças. Ou melhor, estabelecer um prazo para estas mudanças entrarem em vigor. Minimamente seria o exercício fiscal anterior de forma que o contribuinte entrasse o ano sabendo quais regras ele deverá obedecer e sabendo que elas não mudarão. Por certo esta exigência encontrará muitos opositores. Mas tem uma grande vantagem. Para sua implementação não são necessários recursos financeiros. Basta vontade política e persistência administrativa.
André Franco Montoro Filho, Ph. D. em Economia pela Universidade de Yale, é professor da FEA/USP e membro do conselho consultivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco).
Fonte: Valor Econômico
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