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Por Everardo Maciel
Entre os inúmeros ofícios de um tributarista, conceber e instituir modelos talvez seja o mais fascinante e desafiador. Encerra idealizações e fracassos, riscos e oportunidades.
No âmbito das idealizações, a arrogância é o mais perigoso risco. Empolgado pela estética da concepção e afirmação de poder, o jovem tributarista pode ser levado a ignorar que sistemas tributários se sujeitam ao escrutínio da democracia nos Parlamentos, onde transitam emoções e conflitos de razão e de interesse. São, pois, inevitavelmente imperfeitos, como quase tudo o que existe no universo. Esse escrutínio encerra um virtual entrechoque entre o projeto original e a realidade política. Abrangência de pretensão é oficina do diabo. Às vezes involuntária, a negação de limites nas propostas pode ser fatal, correndo o risco de gerar efeitos opostos aos que foram imaginados.
O jovem tributarista deve buscar soluções viáveis em que prevaleçam a economia processual legislativa e o baixo risco jurídico. Políticos e militares sabem bem que pragmatismo é ingrediente indispensável do sucesso. Como tributos não gozam de muito prestígio entre os contribuintes, não convém incomodá-los por coisas de pouca monta.
O jovem tributarista só raramente se anima a consertar. Prefere a luminosidade da inovação. Desconhece a lição do escritor inglês G. K. Chesterton (1874-1936): “O reformador está sempre certo no que há de errado, mas está errado ao não ver o que havia de certo”. Não sabe, provavelmente, que 18 Estados americanos e a Comissão Europeia já institucionalizaram o “direito de consertar” (Consertar é tão importante quanto inovar, Estadão, 21/10/2018). No futuro, quem sabe, esse direito se converterá em obrigação para as políticas públicas.
É temerário, para o jovem tributarista, dispensar o concurso dos que se dedicam profissionalmente à administração dos tributos. Para alguns, esses profissionais parecem muito conservadores; para outros, demasiadamente corporativistas. É uma percepção só eventualmente verdadeira. E também parcial, porque nada diz de sua qualificação, discrição e comprometimento. Tenha-os como aliados; jamais como adversários.
Outro conselho concerne ao autoengano. Lembre-se, logo, que tributo não é panaceia. Desconfie sempre de poções mágicas e de curandeirismo tributário. A utilização de tributos para fins não arrecadatórios, inclusive incentivos fiscais, deve ser parcimoniosa e sujeita a juízo de eficácia. Até mesmo teorias podem ser suspeitas, pois podem ser meros arranjos intelectuais ou proclamações dogmáticas a serviço de contribuintes, regiões ou países. Há, também, construções toscas que tomam simplismos como se fossem simplificação, como a pretensão de unificar tributos cujas bases de cálculo são praticamente iguais, a exemplo de IRPJ e CSLL ou PIS e Cofins. É o reformismo de fachada.
Na perspectiva do contribuinte, tributos devem ser, sobretudo, operáveis. O proveitoso uso de um smartphone não exige do usuário conhecimento sobre sua engenharia de fabricação.
Reproduzir gratuitamente modelos adotados em outros países pode ser tão ridículo quanto a moda dos turbantes, no Rio, na chegada da corte de d. João VI. As damas da corte usavam turbantes apenas porque tiveram de raspar a cabeça, infestada por piolhos, na travessia do Atlântico. Sistemas tributários são moldados por coisas circunstantes da política e da história de um país. É incidental a observância de modelos teóricos.
Embora não detenham o charme dos tributos novos, preste muita atenção no processo e na burocracia tributária. Processo é o sistema arterial do modelo tributário. Suas disfuncionalidades são cruciais, qualquer que seja a forma de extração tributária. Burocracia é requisito da disciplina. Costuma, entretanto, crescer por vontade própria. Excessiva, asfixia o contribuinte.
Um último conselho: conserte o presente, mas olhe para o futuro. Há uma profunda revolução em todos os planos da vida. Tributos também serão protagonistas dessa revolução.
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