Mais uma Intimação da Receita Federal sobre o Siscoserv

Por Roberta Folgueral

Lançado em agosto de 2012 por meio da Lei 12.546/11, o Siscoserv é uma realidade em todas as empresas que se relacionam com o exterior para serviços, intangíveis e outras operações que produzam variação no patrimônio das empresas.

A maior dificuldade da maioria das empresas, no entanto, é conseguir visualizar a obrigação acessória como além de “um mero registro”.

Infelizmente boa parte do mercado ainda vê a obrigação ligada a um mero registro, buscando soluções focadas exclusivamente nas transmissões.

E isto é um erro. E eu vou te dizer (e provar) os motivos.

Há algum tempo nossa equipe vem recebendo contato de empresas intimadas a prestarem esclarecimentos à Receita Federal do Brasil sobre os registros realizados no referido sistema.

Os pedidos sempre foram os mais diversos possíveis:

Que o contribuinte informe os tipos de fretes declarados (se incorporados a bens e mercadorias não necessitam de registros, por exemplo);

Que o contribuinte apresente documentos para justificar a classificação fiscal (NBS) utilizada (sim!!! Quando “escolhemos” uma NBS estamos fazendo uma classificação fiscal tão (ou mais) complicada que a classificação fiscal de mercadorias);

Em todos as intimações recebidas por nossos clientes – e respondidas por nossa equipe --  notou-se o arquivamento do processo fiscal nesta fase. O que não significa, obviamente, que multas por atrasos, inexatidões, omissões não sejam aplicadas.

Todavia, ontem recebemos uma intimação que, particularmente, nos chamou a atenção por alguns motivos que veremos adiante.

E, gostaríamos de frisar que, embora o teor tenha chamado nossa atenção ele não nos assustou, já que quem nos acompanha desde o início já leu, já ouviu e já viu vídeos alertando para os riscos com a falta de compliance por parte das empresas.

Esta intimação tem um teor que deveria, e muito, preocupar as empresas que ainda insistem em dizer que o Siscoserv é um mero registro com finalidade estatística.

Peço que olhem com calma a imagem que trago para provar que o Siscoserv é ferramenta de cruzamento de dados poderosíssima:

Vamos começar a pensar sobre o teor desta intimação?

Segure-se na cadeira se você (ou sua empresa) ainda insiste em dizer que o Siscoserv “não vai dar em nada, é mero registro, etc”.

Alguns pontos são importantes para você compreender a força e a efetividade do cruzamento de dados.

É necessário saber algumas coisas importantes sobre essa intimação:

O contribuinte nos enviou fora do prazo fixado pela Receita Federal, portanto ela não foi respondida, ensejando a aplicação de multa de R$ 5.000,00 pelo não atendimento à intimação;

A Receita Federal do Brasil encaminhou um relatório, em Excel, contendo a lista completa dos registros que são objeto de fiscalização;

Ainda que sejam detectados erros nos registros, como o procedimento de fiscalização já foi iniciado, a retificação de qualquer informação não será tratada como espontaneidade, não afastando a aplicação de multas;

Todos são registros de AQUISIÇÃO e PAGAMENTO de FRETE de EXPORTAÇÃO.

Bem, narrados estes pontos, passemos à analise da intimação.

A base legal para a intimação foi o Decreto n. 3.000/99 (Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza). Os artigos do Decreto, mencionados na intimação amparam a RFB a solicitar documentos comprobatórios das operações destacadas.

Importadores, exportadores, prestadores e tomadores de serviços, agentes intermediários que ainda acreditam que a manutenção de arquivos, contratos entre as partes, notas fiscais, notas de débito, de crédito, invoices, contratos de câmbio não são documentos relevantes, comecem a rever este posicionamento e acionem, imediatamente, os gestores para mensuração de riscos e implementação de rotinas, políticas internas e compliance.

Anote-se que se os registros elencados no relatório encaminhado são exclusivamente de frete de exportação, no qual o exportador SÓ PODE FIGURAR NA POSIÇÃO DE TOMADOR DE SERVIÇOS, JÁ QUE NÃO É PRESTADOR DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE INTERNACIONAL, conforme dezenas de Soluções de Consultas publicadas ao longo de 2016 e todas vinculadas às Soluções de Consulta 257/14, 222 e 226/15, por que os registros foram feitos em duas moedas?

Há FRETES internacionais contratados em REAIS? Se os prestadores (emissores de conhecimento de transporte) são estrangeiros, seus contratos figuraram em reais?

A inexatidão, inclusive de moeda, pode ser punida com 3% sobre o valor da operação. Se tudo estiver errado (o que não acreditamos), o contribuinte somente neste item, poderá ser autuado em pelo menos R$ 360.000,00.

Sabidamente, os embarques são realizados diretamente com a agência marítima que representa o emissor do contrato de transporte (popularmente conhecido como “embarque direto com o armador”, embora muitas vezes quem arme o navio, não necessariamente seja o operador do veículo ou emissor do contrato de transporte). Não há câmbio, o pagamento é feito por meio desta agência.

Trata-se de erro muitíssimo comum cometido pelo Exportador (e o importador também), confundir o conceito de formação de preços de suas mercadorias com o conceito de prestador de serviços, acreditando que ao vender uma mercadoria “custo e frete”, vende também FRETE. Este erro talvez possa explicar os motivos pelos quais o contribuinte registrou os processos em duas moedas.

É importate que os contribuintes comecem a compreender que os incoterms SÃO SIM objeto de validação de relação contratual e, eu quero muito acreditar que quem fala o contrário, inclusive em livros, não conhece o comércio exterior.

Neste sentido, a RFB pede que, caso o pagamento não tenha sido realizado por meio de contrato de câmbio, que o contribuinte apresente a razão social, o CNPJ e os comprovantes dos pagamentos realizados por estes intermediários.

Aqui reside o ponto mais delicado e preocupante da intimação que é o em que a RFB pede que o contribuinte indique quem são os agentes que intermediaram a operação.

E você deve estar se perguntando: por quê? Simples: para saber quem está sonegando; o exportador ou seu agente de cargas – ou ambos.

Como assim? Eu te explico.

O exportador, ao pagar a agência marítima (ou o agente de cargas, porque este conceito vale também para a importação) recebe uma Nota de Débito (ou um recibo) para os valores relativos ao FRETE e uma nota fiscal relativa aos serviços prestados pela agência. Correto?

Não, errado!

Infelizmente, na prática a realidade é outra. É a prática da sonegação, disfarçada de taxas – e não questionada pelo tomador de serviços, neste caso, o exportador.

E o tomador pode ser responsabilizado, solidariamente, por não ter exigido a Nota Fiscal corresponde a toda e qualquer taxa que não seja parte integrante do frete.

Veja: Ou os valores dizem respeito ao valor total do frete (e portanto, destacados no conhecimento de transporte) ou os valores são relativos aos serviços prestados pelos agentes de cargas (ou agências marítimas). Não há como, jurídica e tecnicamente, conceber nenhuma prática diferente disto.

Esta recente intimação demonstra que o buraco é bem mais embaixo. Registrar, não registrar, registrar com atraso, embora seja de extrema relevância, e que nos parecia, num primeiro momento, ser o primeiro foco da SRF, agora aparece como pano de fundo.

O cruzamento de dados, a sonegação, a evasão de divisas, os crimes contra a ordem tributária que se mostravam como pontos a serem contemplados num segundo plano, aparecem como protagonistas.

Isto assusta? Sim, e muito.

E a quem assusta?

Não àqueles que estão registrando com atraso, certamente. Mas, àqueles que, independentemente de estarem registrando com atraso, fornecendo informações inexatas, NBS incorretas etc., e que escondem (ou tentam esconder) algo muito mais interessante para a Receita Federal: a verdade sobre suas operações.

Por isto, cada vez mais forte fica nossa convicção de que o caminho é o registro, mesmo atrasado e a denúncia espontânea, principalmente quando estamos tratando com este sem número de empresários corretos, que lutam para sobreviver à crise, que recolhe (a duras penas) seus impostos e contribuições.

Por isto insistimos tanto nestes anos todos na prevenção, exatamente para ver nossos clientes sendo tratados de forma diferenciada, numa possível (e não eventual) intimação e/ou autuação.

Será que os prestadores e tomadores de serviços que apenas estão atrasados em seus registros e que, em tese, falharam tão somente com as “estatísticas do MDIC” serão tratados da mesma forma que aqueles que não conseguirão explicar, por exemplo, porque não emitiram notas fiscais, porque emitiram notas fiscais fora do prazo, porque não recolheram os impostos, porque os contratos de câmbio são incompatíveis com a operação, porque foram coniventes com seus parceiros comerciais que deixaram de emitir notas fiscais corretas e etc ?

Acho que não.

E acho, sinceramente, que o mercado precisa urgentemente compreender que o Siscoserv não abrange somente registros ou sistemas informatizados que apenas transmitem estes registros.

http://www.canaladuaneiro.com/artigo/comex/53/mais-uma-intimacao-da...

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