Blog da BlueTax moderado por José Adriano
Blog da BlueTax
Criação de ‘ranking’ de bons contribuintes pela lei é vista com entusiasmo e desconfiança por especialistas.
Conhecida pelo nome de ‘Nos Conformes’, a Lei Complementar nº 1320/2018, aprovada pelo estado de São Paulo em abril, está promovendo uma “mudança de paradigma” – ao menos na visão de advogados, professores e representantes de classe ouvidos pelo JOTA. O Programa de Estímulo à Conformidade Tributária, criado pela legislação, propõe uma abordagem considerada menos contenciosa na relação entre contribuintes e o Fisco paulista, dando tratamento especial às empresas que estão em dia com as suas obrigações tributárias. A mudança, porém, tem gerado desconfiança, e pairam dúvidas sobre o caráter impessoal de uma norma que promete vantagens a certo grupo de empresas.
A Lei Complementar (LC) tenta estabelecer uma série de critérios que visam reduzir a histórica desconfiança entre órgãos fiscalizadores e os contribuintes. De acordo com o texto, a norma é baseada, dentre outros, nos princípios da simplificação do sistema tributário estadual, previsibilidade de condutas e publicidade e transparência na divulgação de dados e informações.
As medidas a serem implementadas pela lei, após regulamentação, devem promover privilégios às empresas que mantém suas contribuições em dia com o Fisco. A principal delas estaria no artigo 5º, que define um sistema de classificação em categorias de risco sobre os contribuintes de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que irão de “A+” a “E”, para separar o tratamento de empresas com aderência ao programa tributário estadual e os devedores contumazes.
Os critérios para a classificação, segundo os incisos I a III, serão as obrigações tributárias e pecuniárias vencidas, a apresentação de documentos, e o perfil dos fornecedores do contribuinte. Às empresas consideradas como exemplares – grupos A+ e A – a lei permite a apropriação de crédito acumulado, renovação de regimes especiais e o acesso ao regime de Análise Fiscal Prévia. Aos devedores contumazes, o artigo 20 garante a inclusão do contribuinte em um “programa especial de fiscalização tributária” e a centralização do pagamento do ICMS devido em um dos estabelecimentos.
Apoio por todos os lados
A construção do projeto contou com participação da classe acadêmica – em especial da Fundação Getúlio Vargas (FGV) . A instituição recebeu advogados e membros da administração pública, como o secretário-adjunto da Fazenda do estado de São Paulo, Rogério Ceron, que é doutorando na casa. “Foi uma construção de fato coletiva, uma reunião de esforços em torno de um ideal comum. Por mais que opiniões e interesses sejam de alguma forma distintos, o objetivo era o mesmo – construir um modelo de gestão tributária moderno, racional e mais eficiente, no estado de São Paulo”, afirmou o secretário-adjunto durante seminário na instituição, no final de abril.
O projeto foi promulgado, na forma de lei complementar, em 6 de abril, um dia antes da data-limite que o então governador do estado, Geraldo Alckmin (PSDB), renunciasse o cargo para concorrer ao cargo de presidente pela legenda. O destino da medida pode ecoar sobre o candidato, uma vez que não há outros projetos semelhantes em tramitação em estados e no legislativo federal. Para divulgar a nova política, a Secretaria da Fazenda chegou a publicar um vídeo explicativo em suas redes sociais.
A necessidade de mudança de abordagem é defendida pelos atores na construção do conceito por trás da “Nos Conformes”. “Existe uma constatação geral, por conta de todos os operadores do direito tributário, que o sistema que a gente tem hoje não funciona”, explica Lina Santin, coordenadora do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV (NEF/FGV).
O professor da FGV Direito Eurico de Santi, que também participou da elaboração da lei, lembrou do conceito de Pirâmide de Conformidade, que tem como premissa incentivar e facilitar a operação de empresas que mantêm suas obrigações tributárias em dia, e usar a força da lei contra os chamados devedores contumazes. O artigo 1º da lei complementar, lembrou o professor, estabelece uma série de princípios norteadores para o qual as políticas de conformidade deverão ser pautadas.
O conceito norteador da lei recebeu elogios da classe advocatícia. “É um pouco prematuro dizer se a lei será boa ou não, mas o objetivo inicial é muito importante”, avaliou o sócio de tributário do Duarte Garcia, Serra Netto e Terra, Jayr Viégas Gavaldão Junior. O tributarista também aguarda a regulamentação, por entender que só assim a legislação poderá mostrar seu real potencial.
A lei complementar recebeu elogios também de representantes do Fisco. Para o presidente da Associação dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Afresp), Rodrigo Spada, a medida é essencial para quebrar antigos estigmas. “O Fisco acaba sendo visto hoje como carrasco e algoz pela sociedade, devido à legislação tributária complexa”, afirmou o representante. “Essa legislação dá as ferramentas para que o Fisco saia do paradigma de repressão e passe ao paradigma de prestação de serviço público e de orientação.”
Spada reconhece que lacunas devem ser preenchidas antes da total entrada em vigor da lei, na forma de regulamentação. O presidente da Afresp credita a reserva de parte da classe advocatícia ao fato de que o “Nos Conformes” ainda está em fase de regulamentação. A visão é compartilhada por Lina Santin. “O projeto está em fase de regulamentação, e às vezes tem gente dizendo que o projeto ‘é bom demais para ser verdade’”, ponderou.
Estado não deve ferir impessoalidade
Sócio do Advocacia Lunardelli, Pedro Guilherme Lunardelli elogia a preocupação do governo em reverter e diminuir o atual quadro do contencioso, mas também teme que a lei promova efeito contrário,causando a judicialização uma série de temas. Um dos primeiros pontos de discordância seria o prejuízo contraído pelos contribuintes na relação com fornecedores que possam ter histórico de má-fé. “Este é um tema pacificado nos tribunais superiores: o contribuinte não pode ser absolutamente impactado, na relação com o Fisco paulista, tomando em consideração o fornecedor”, afirmou Pedro.
O ponto que considerou mais problemático dentro da nova legislação, porém, seria uma “discricionariedade infundada e vinculada”, ferindo o preceito constitucional da impessoalidade (art. 37, em seu caput). “Se você de fato cumprir todas as suas obrigações acessórias e pagar todos os impostos, você terá direito a um Estado mais eficiente, ou a serviços menos burocratizados, procedimentos mais ágeis. Significa que quem não paga imposto vai ser apenado por um estado burocrata e lento”, afirmou.
O exemplo mais controverso apontado pelo advogado é o dispositivo de Análise Fiscal Prévia, previsto no inciso II do artigo 14 da “Nos conformes”. De acordo com o dispositivo, empresas listadas com as notas “A” e “A+” poderão pleitear que o Fisco paulista realize uma análise em suas operações, sem que eventuais problemas ou descumprimentos de legislação gerem autos de infração imediatamente, dando a chance da boa contribuinte efetuar reparos antes da fiscalização real.
A suposta falta de impessoalidade também é apontada por Jayr Viégas Gavaldão Junior. “Já da leitura da lei é possível constatar que há margem para uma discriminação séria, que pode violar alguns princípios, principalmente o da isonomia”, analisou. “Se o critério utilizado para discriminar contribuintes não for idôneo, acabamos entrando no campo da inconstitucionalidade, podendo a lei ser contestada”.
Fonte: JOTA
https://mauronegruni.com.br/2018/05/15/sp-novo-paradigma-ou-incerte...
© 2024 Criado por José Adriano. Ativado por
Você precisa ser um membro de Blog da BlueTax moderado por José Adriano para adicionar comentários!
Entrar em Blog da BlueTax moderado por José Adriano