Não é ao projeto do advogado mineiro Vinícios Leôncio, de reunir num único livro toda a legislação tributária em vigor no País, que se aplica a qualificação de "verdadeira insanidade" dada pelos amigos a sua empreitada. Ela se aplica, de fato, e com precisão, ao conteúdo da obra. Monstruosamente extensa, detalhista demais, exigente em excesso e em constante modificação e ampliação, a legislação tributária brasileira - formada por um cipoal que começa nas normas constitucionais e se estende por leis, decretos, portarias e instruções normativas, editados continuamente nos três níveis de governo - exaure o contribuinte, confunde-o, exigindo dele um ingente trabalho para entender e cumprir todas as regras e, mesmo assim, o deixa vulnerável à ação implacável dos fiscais dos órgãos arrecadadores. É uma verdadeira insanidade.

 

É assustador o resultado do material do trabalho de quase duas décadas do advogado mineiro, mostrado na reportagem de Eduardo Kattah publicada domingo pelo Estado. Sua intenção era apresentar, de maneira explícita, o tamanho e a complexidade da legislação tributária, com todas as normas federais, dos 26 Estados, do Distrito Federal e dos mais de 5 mil municípios. Quando pronto, o livro terá 43,2 mil páginas, cada uma com 2,2 m de largura e 1,4 m de altura, e pesará 6,2 toneladas - com registro assegurado no livro Guinness de recordes.

Todo mundo sabe que a legislação brasileira é muito extensa, mas ela nunca teve visibilidade concreta, justificou o advogado. E sua ideia foi "mostrar para a sociedade o tamanho da legislação de um país que edita (em média) 35 normas tributárias por dia útil".

Outros tributaristas vêm, há tempos, mostrando o caráter caótico das regras tributárias brasileiras, formadas por mais de 3 mil normas federais, além de milhares de normas estaduais e municipais.

A extrema complexidade do sistema tributário impõe aos contribuintes um enorme trabalho para cumprir integralmente as normas. O aumento da eficácia e da amplitude do trabalho dos agentes fiscais dos três níveis de governo, por sua vez, resulta em mais pressão sobre as empresas para o cumprimento estrito de todas as regras e das obrigações acessórias.

O resultado prático mais danoso dessas pressões e desse sistema caótico já é conhecido internacionalmente - o alto custo da burocracia tributária. Na mais recente pesquisa anual realizada pelo Banco Mundial sobre a facilidade de realização de negócios, a Doing Business, o Brasil ocupa a 129.ª posição entre 183 países. Na América Latina, está à frente apenas de Equador, Bolívia, Venezuela, Haiti, Suriname e Honduras.

O pior resultado do País está no item "procedimentos para o pagamento de impostos", em que ocupa a 150.ª posição. Segundo a pesquisa, os empresários brasileiros arcam com o custo de 2.600 horas anuais para cumprir as obrigações tributárias. Na América Latina e no Caribe, o gasto médio é de 385,2 horas por ano; nos países de renda alta que integram a OCDE, a média é de 194,1 horas anuais.

Em recente trabalho sobre os custos do sistema tributário, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) observou que, com a edição constante de novas normas, o governo se vê obrigado a abrir concursos para mais e mais fiscais e funcionários da Receita e as empresas, a inchar mais e mais seus departamentos contábeis e jurídicos.

O aumento dos custos, para atender a um número cada vez maior de exigências tributárias, acaba sendo transferido para os clientes, o que resulta em pressão sobre os preços. Nem assim os contribuintes se sentem seguros, pois, com as mudanças frequentes das normas e com o aumento do rigor do Fisco na interpretação delas, nunca se tem certeza de que todas as obrigações estão sendo cumpridas.

Além disso, o prazo para o recolhimento de tributos é, muitas vezes, menor do que o concedido pelas empresas para o pagamento do bem ou serviço vendido, o que as força a obter financiamento para pagar impostos.

E tudo isso sem falar no aumento ininterrupto da carga tributária nos últimos anos, que torna cada vez mais difícil a atividade econômica no País. 

 

08 de fevereiro de 2011 | 0h 00

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Comentário de José Adriano em 8 fevereiro 2011 às 10:00

Autor dormiu nas ruas antes de se tornar advogado

06 de fevereiro de 2011 | 0h 00

Vinícios Leôncio, de 51 anos, é autor de outros cinco livros que tratam do tema tributação. Também um estudioso do direito canônico, duas dessas obras possuem conotação religiosa: A quarta filosofia: Jesus Cristo não pagou o tributo e Em nome do Pai e do Filho. O advogado tributarista tratou do assunto tecnicamente em outros três livros: Manual do Refis, Lucro Arbitrado e Tributos federais interpretados pela Receita Federal do Brasil.

 

Natural do município de Iguatama, na região oeste de Minas Gerais, Leôncio se mudou para Belo Horizonte ainda adolescente, no fim dos anos 1970. Sem dinheiro ou parentes, perambulou e dormiu nas ruas da capital por quase dois anos.

"Sou filho de barranqueiro de rio, de pescador, e sempre tive o sonho de ser advogado. O único jeito de conseguir isso na época era vir para Belo Horizonte. O problema é que eu só tinha o dinheiro da passagem. Comi muito resto de lanchonete."

Atualmente um profissional de sucesso, dono de um escritório que leva seu nome, o advogado não se lembra desse período de vacas magras com amargura ou tristeza. Pelo contrário, diz que foi nas ruas de Belo Horizonte H que tomou gosto pela literatura, influenciado por um ex-maestro - que, por questões emocionais, acabou abandonando a família e se tornando um sem-teto. "Eu estudei Marx, estudei Rousseau na rua."

Leôncio pretende levar sua gigantesca obra, quando concluída, para uma fazenda centenária que adquiriu e está reformando em Santana dos Montes, no interior de Minas.

Apesar da satisfação com o projeto, o advogado admite que, nesses quase 20 anos, pensou algumas vezes em desistir. "A gente tem de tomar a decisão de não começar. Porque, depois que começa, fica difícil parar." 

 

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110206/not_imp675807,0.php

Comentário de José Adriano em 8 fevereiro 2011 às 9:57

Legislação tributária vira livro de 6 toneladas

Advogado reúne todas as leis de impostos do País em livro que deve entrar para o ''Guiness''

06 de fevereiro de 2011 | 0h 00
Eduardo Kattah - O Estado de S.Paulo

De tão ousada e inusitada, a ideia chegou a ser tachada como uma "verdadeira insanidade" pelos colegas, mas o advogado mineiro Vinícios Leôncio ignorou os descrentes e iniciou há quase duas décadas um projeto para reunir em livro as legislações tributárias do País.

 

Movido pela inconformidade com o que considera um excesso de normas, o tributarista queria, a princípio, apenas mostrar de forma simbólica o peso dessa legislação no custo das empresas brasileiras.

Porém, ao agrupar numa publicação toda a legislação nacional, Leôncio acabou por credenciar sua obra ao ingresso no Guinness World of Records como a mais volumosa e com o maior número de páginas do mundo.

Previsto para ser concluído em junho deste ano, o livro conta atualmente com cerca de 27 mil páginas impressas - cada uma delas com 2,2 metros de altura por 1,4 metro de largura. Depois de pronta, a obra pesará 6,2 toneladas para um total de 43.216 páginas, que, se enfileiradas, alcançariam uma distância de 95 quilômetros.

"A legislação brasileira é muito extensa, mas ela nunca teve visibilidade concreta. Essa foi a ideia, mostrar para a sociedade o tamanho dessa legislação, de um país que edita (em média) 35 normas tributárias por dia útil", destaca Leôncio, um estudioso do assunto.

"A questão era justificar o peso que tem a burocracia tributária na economia das empresas e procurar saber por que o Brasil é o único país do mundo no qual as empresas consomem 2,6 mil horas anuais para liquidar seus impostos, só de burocracia."

O espírito crítico do advogado em relação ao assunto fica evidente no título que ele escolheu para a obra: Pátria Amada. "Tem de amar muito essa pátria para tolerar isso", ironiza. "Até nós, advogados tributaristas, temos dificuldade de acompanhar esse volume enorme de legislação."

Cruzada. Leôncio iniciou seu projeto em 1992. Desde então, o advogado mineiro empreendeu uma verdadeira cruzada para viabilizar tecnicamente a empreitada e desembolsou cerca de R$ 1 milhão (aproximadamente 35% desse total foi gasto com impostos, segundo o advogado).

A primeira dificuldade foi encontrar uma gráfica que aceitasse a encomenda. Todas que foram procuradas recusaram. "O Brasil não tem nenhuma impressora com esse padrão."

Com o auxílio de um gráfico amigo, que topou o desafio, a solução encontrada foi adaptar uma impressora de outdoors. Para isso, no entanto, Leôncio precisou enviar emissários à China, que adquiriram equipamentos e importaram tecnologia para a manutenção da impressora. Ele praticamente montou uma gráfica em Contagem, na região metropolitana da capital mineira.

Após muitos empecilhos, em 2010 os técnicos conseguiram que a máquina imprimisse os dois lados da folha imensa. Em fonte Times New Roman, as letras têm corpo tamanho 18, impressas com tinta de vida útil de 500 anos. O advogado pretende também que a obra possa ser consultada e pediu que um engenheiro aeronáutico desenvolvesse amortecedores para regular a virada das páginas.

Leôncio, contudo, considera que a maior dificuldade enfrentada foi mesmo a de agrupar as 27 diferentes legislações dos Estados e do Distrito Federal e os mais de 5 mil códigos tributários dos municípios brasileiros. "Em vários municípios, o código ainda está escrito a mão."

Parte do levantamento precisou ser feito in loco. "No auge dessa pesquisa cheguei a ter 45 pessoas trabalhando para mim. Nem todos os municípios têm sites e a legislação disponibilizada eletronicamente. Aí é com correspondência... Mas, mesmo assim, muitas prefeituras não se dispõem a colaborar, fornecer a legislação, embora seja pública."

"Susto". Para mostrar a dimensão de seu projeto, Leôncio afixou algumas páginas na parede da biblioteca de seu confortável e amplo escritório, na região centro-sul de Belo Horizonte. O advogado garante que sua aspiração nunca foi o Guinness Book, mas sim chamar a atenção para a necessidade de uma reforma tributária.

"Não me passava pela cabeça essa coisa de recorde, mas com o passar dos anos eu fui percebendo que o livro será o maior do mundo", diz, salientando que o atual título pertence a um livro sueco de 2,7 toneladas.

Leôncio assegura também que não espera nenhum retorno financeiro com o projeto. Enquanto apresenta à reportagem gráficos comparativos - que mostram que o tempo anual gasto para o pagamento de impostos no Brasil é muito superior ao de outros países (sejam os dez mais ricos, os dez mais pobres ou mesmo os 15 mais burocráticos do mundo) -, ele observa que espera mesmo é que sua obra leve o próprio Estado a fazer uma reflexão.

"Acho que a sociedade vai levar um susto com isso. A própria classe política, o Fisco, eles não tem noção, em todas as esferas estatais, do tamanho da legislação tributária brasileira." 

 

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110206/not_imp675806,0.php

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