CIOs enfrentam pressão cada vez maior (inclusive o SPED)

por Ana Lúcia Moura Fé | Especial para InformationWeek Brasil

04/05/2009

Cautela ou ousadia? Não importa a postura adotada pelo diretor de TI diante da crise. A cobrança por resultados será a mesma - ou maior

É difícil a vida de CIO em tempos de crise. Não que seja fácil em outras circunstâncias, uma vez que as exigências impostas pela recessão global não são de todo desconhecidas dos executivos da área. Cortar custos, reestruturar orçamentos, repensar projetos e, ainda assim, atingir metas e incrementar resultados, ou seja, "fazer mais com menos", é mantra conhecido dos departamentos de tecnologia. E isto no cenário otimista dos últimos anos, com a TI crescendo acima da economia. Agora imagine este quadro sob a sombra de uma turbulência sem precedentes, que pressiona os gastos para baixo, exige decisões rápidas e teima em não mostrar uma luz no fim do túnel. O impacto no orçamento, nas prioridades e nas estratégias de TI é praticamente inevitável, embora possa variar em intensidade e abrangência.

De acordo com o diretor de consultoria da IDC Brasil, Roberto Gutierrez, não está sendo fácil medir o impacto da crise nas áreas de tecnologia porque a instabilidade, que é a tônica deste contexto, se reflete nas atitudes empresariais. "Opiniões de analistas e indicadores da economia mudam o tempo todo, e isto afeta decisões", diz. Por outro lado, já se pode observar grande dispersão nos posicionamentos das companhias. "Há aquelas que afirmam que a crise não as atingiu, as que admitem cortes nos investimentos e até as que decidiram paralisar projetos apenas ‘por via das dúvidas". Ainda não dá para dizer qual grupo prevalece", diz o consultor.

A IDC adianta que a revisão de prioridades está entre as reações mais observáveis. No caso de tecnologia, saltam para o topo da lista os projetos que reduzem custos rapidamente, enquanto são empurrados para o fim da fila aqueles mais complexos, com retorno mais demorado ou de difícil mensuração. É o "first things fasters", captado entre os CIOs pelos analistas do Gartner. As condições mutantes da economia tornam alguns grandes projetos irrelevantes e exigem do tomador de decisão a coragem de reconhecer que coisa importante também pode esperar.

Jedey Miranda, CIO da Eaton para a América Latina, está seguindo à risca essa linha. "O orçamento foi decidido em 2008, mas alteramos as prioridades, substituindo alguns projetos por outros que vão ajudar a companhia a aumentar vendas, melhorar retorno e reduzir custos." A Eaton, que produz componentes automotivos, está focando, por exemplo, em aplicativos de colaboração como mensagens unificadas, videoconferência e webcasting. "São projetos alinhados com as necessidades do negócio e com o nosso modelo de governança. Reduzem os custos com viagens e aumentam a produtividade", diz.

A Eaton também definiu como importantes a consolidação de data centers, a inteligência de mercado e a simplificação do portfólio de soluções. "Com menos aplicações, diminuo o custo por unidade", explica. Além disto, Miranda ressalta que, como CIO, deve assumir a posição de piloto (nunca passageiro) e aproveitar a oportunidade para corrigir percepções erradas sobre o papel da TI. "Ninguém gosta de crise, mas este é um momento excelente para tirar da TI a imagem de centro de custos e mostrar seu valor para o negócio", defende. Ele afasta o pessimismo, mesmo com menos dinheiro no bolso e equipe desfalcada. "Nosso orçamento foi levemente reduzido, e o realinhamento de projetos levou à demissão de pessoal. Mas sou otimista e acho que, a partir de agora, o mercado começa a se recuperar."

Ponderar é fundamental

A cautela é defendia por alguns estudiosos da academia, que orientam o conservadorismo nos investimentos até os indicadores tornarem-se mais sólidos, sem, contudo, perder oportunidades captadas no contexto da crise. A opção pela cautela excessiva, entretanto, não é unanimidade entre os especialistas. "Não vejo com bons olhos essa tendência de priorizar o que é urgente e esquecer o resto. Desacelerar um projeto estratégico pode ser muito ruim para o negócio. Mesmo diante de pressão e cortes, a análise do CIO tem de ter menos emoção", diz Jaci Corrêa Leite, professor da FGV-EASP.

Por outro lado, ele alerta que o CIO pode se ver numa encruzilhada. "No cenário atual, aquele que se concentra em grandes projetos, com maturação longa, corre o risco de perder sustentação política na empresa, e até o cargo, mesmo que esteja fazendo um bem para a companhia", diz. Essa hipótese parece não preocupar Antonio Gil, CIO da Deten Química. "Não apenas mantivemos projetos, orçamento e prioridades para 2009, como ampliamos o escopo de sistema de informação que trará ganhos de produtividade para a empresa." Mas o executivo não nega a importância de reavaliar e priorizar ações, juntamente com as áreas de negócios. "É preciso também considerar os riscos da não realização de um projeto."

Gil conseguiu manter os seus planos originais, mas foi orientado pela diretoria da petroquímica a atentar para a redução de custos. Alinhada com a prioridade de TI número um de CIOs do mundo todo, sua equipe terá o projeto de business intelligence (BI) entre os principais focos de 2009. Com a inteligência, a Deten espera conseguir enxugar gastos com transporte e agilizar a implantação de infraestrutura em novos sites de distribuição. Também deverá adequar o sistema de pesagem a novas formas de transporte dos produtos. "A logística é essencial no nosso negócio, porque estamos no Nordeste e nossos principais clientes no Sudeste." Outros itens da lista são virtualização e consolidação de servidores, nota fiscal eletrônica, Sped e adequação dos processos de gestão à metodologia Itil.

Na Leroy Merlin, rede varejista especializada em construção, a crise aumentou o rigor quanto a melhorias de níveis de serviço de TI, orçamento e calendário de projetos. "Sou porta-voz das oportunidades que a crise representa", diz Anderson Cunha, CIO da companhia, de olho em temas que ficam normalmente em segundo plano, como produtividade, eficiência operacional e simplificação de processos. Ele também está empenhado em promover o otimismo e evitar que a insegurança gere imobilismo. "A redução de custos deve ser avaliada pelo prisma do ganho de produtividade", ensina.

O Grupo Nordeste, especializado em segurança privada, também alterou pouco os seus planos e sem redução de equipe. O conglomerado adquiriu empresas nos últimos anos, o que requer investimentos pesados em infraestrutura e treinamento. O CIO, André Navarrete, relata que, apesar de a crise ainda não ter afetado diretamente o mercado de segurança, sentiu os reflexos do aumento dos custos dos insumos atrelados ao dólar e teve de reavaliar alguns investimentos.

Mas, em termos gerais, houve queda no valor proporcional destinado a cada projeto, embora o orçamento de TI para 2009 tenha permanecido praticamente inalterado. "Faremos mais com o mesmo montante total", explica Navarrete. Durante o ano, sua equipe se dedicará principalmente à racionalização de custos de telecomunicações, à preparação para o Sped e à operação e padronização de processos e sistemas nas empresas adquiridas. Também estão previstos upgrade de ERP, aquisição de ferramentas de colaboração e atualização da plataforma de hardware e de sistemas operacionais.

Como agir

Para Navarrete, as ações do diretor de TI nos tempos atuais dependem do estágio de maturidade da governança corporativa e de como a TI é vista pela alta administração. "Quanto mais avançada a governança, mais proativo ele deve ser", acredita. O CIO, segundo ele, deve estar preparado tanto para defender projetos essenciais quanto para promover cortes. Acima de tudo, deve abrir espaço para a participação, criatividade e inovação. "Foi na seção de sugestão de nossa intranet que surgiu a idéia de implantação de VoIP, que no primeiro ano de operação nos rendeu uma economia de R$ 2 milhões", exemplifica.

Inovação também é palavra-chave na Unilever, multinacional do mercado de bens de consumo. A empresa, que investe pesado em tecnologia para suportar em média 70 inovações por ano, não tem intenção de alterar as ações previstas em plano que cobre o período de 2009 a 2012. "É claro que neste prazo é preciso estar atento às oportunidades e à dinâmica do mercado. Mas os investimentos estão mantidos, atendendo às prioridades definidas para cada área, incluindo TI", diz Luiz Carlos Dutra, vice-presidente de assuntos corporativos e porta-voz de TI.

A Unilever acredita que quem continuar investindo vai sair mais forte do turbilhão, com ampla vantagem competitiva. Dutra informa que não houve redução de pessoal devido à crise e que a operação brasileira está otimista em relação a 2009, depois de ter faturado mais de R$ 10 bilhões em 2008, contra R$ 9,7 bilhões em 2007. A postura da Unilever está de acordo com a visão do analista Pedro Bicudo, da TGT Consult. "Lute contra a reação natural diante da crise, que é de cortar custos e pessoal. Mantenha os seus recursos, porque em 2009 a demanda por gente de TI continuará maior do que a oferta de profissionais qualificados. Você terá dificuldades de trazê-los de volta quando houver a reação do mercado."

O conselho do analista não é mero exercício de otimismo. Ele observa na sua clientela o fortalecimento da percepção de que a freada no Brasil, embora séria, é menos drástica do que no resto do mundo. "A crise se agravou exatamente em um período de elaboração de orçamentos. A pisada no freio foi automática, especialmente nas multinacionais. Mas muitas empresas já começam a reavaliar esta decisão e a retomar projetos", diz.

Os institutos de pesquisa são unânimes em suas projeções de aquecimento do mercado de terceirização, apesar (ou por causa) da turbulência econômica. Do business process outsourcing (BPO) à computação em nuvem, passando pelo software como serviço (SaaS), entre outras opções, o outsourcing entra no radar dos CIOs porque a crise fortalece o seu principal apelo, que é transformar despesa fixa em variável, além de permitir que a empresa se concentre no seu negócio principal. "A cloud computing e a virtualização, como forma de reduzir custos relacionados com servidores e storage, estão entre as fortes tendências que observo hoje no mercado", testemunha Adriano Giudice, presidente da BearingPoint.

A Rede Adventista Silvestre de Saúde, com sede no Rio de Janeiro, está entre as que apostaram nessa onda. No começo deste ano, a empresa repassou para a Simpress todo o seu processo de impressão. "A decisão foi tomada no auge da crise", diz Ari Rangel, gerente de TI da rede. Ele convenceu a diretoria mostrando o tamanho da economia esperada, além de outros benefícios. "Reduzimos em 30% o custo com insumos, que era de 30 mil reais mensais", diz. O número de cópias por mês caiu de 200 mil para 150 mil, resultado do controle mais eficaz.

A empresa de saúde também deu continuidade ao projeto iniciado em julho de 2008 de modernização de toda infraestrutura de TI tanto do hospital no Rio quando da operadora de plano de saúde. Entre analistas, há quem acredite que a recessão global influenciará cada tendência e desenvolvimento na área de TI, acelerando a adoção de novas tecnologias e modelos de negócios. No olho do furacão, o CIO enfrenta o desafio de ajustar suas próprias competências. "Porque mudou o foco. Antes, o board exigia uma visão de futuro, uma busca por grandes inovações com resultados de longo prazo. Agora, quer resultado em poucos meses", diz Bicudo. Neste novo contexto, está em desvantagem tanto o excelente técnico que entende pouco de planejamento e gestão, quanto o seu oposto.

Imperativos para CIOs em 2009

Após ouvir mais de 1.500 CIOs de todo o mundo, o Gartner descobriu que este profissional demonstrará sua liderança na crise por meio dos seguintes imperativos:

- Ser decisivo ao priorizar ações que aumentam a eficiência da empresa, focando a melhoria dos processos de negócios, usando BI para aumentar a visibilidade e elevando a eficiência da força de trabalho.

- Adotar a prática do "first things faster".

- Ser hábil na reestruturação da TI para aumentar sua produtividade e agilidade - porque o negócio não irá reduzir sua demanda por TI apenas porque os CIOs têm menos recursos.

- Modernizar a infraestrutura técnica, já que novas tecnologias oferecem custos mais baixos, gastam menos energia, têm melhor desempenho e maior capacidade - coisas que a empresa precisará muito no contexto atual.

http://www.itweb.com.br/noticias/index.asp?cod=56930

José Adriano
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