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As mudanças estruturais e tecnológicas vividas pela contabilidade nos últimos anos começam a surtir efeito na área acadêmica e, consequentemente, na formação de novos profissionais. A adoção das normas internacionais, suplantando o modelo vigente anteriormente e a influência da Tecnologia da Informação (TI), através de elementos como o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) Contábil e Fiscal, são alguns dos fatores que influenciaram a criação de novas diretrizes nos cursos de graduação e pós-graduação.
O tempo em que o contador era responsável apenas por fazer escrituração ficou para trás. O burocrata absorto em uma pilha de papéis deu lugar ao gestor da informação. “O profissional está muito mais inserido no processo decisório da empresa, se configurando não só em um assessor fiscal e tributário”, analisa o coordenador da Comissão de Graduação em Ciências Contábeis e Atuariais (Cgatu) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), João Marcos da Rocha.
Para acompanhar as necessidades impostas pelo mercado de trabalho, o processo de formação de contadores passa por diversas modificações. Com o Brasil priorizando uma legislação societária em detrimento da legislação fiscal, os cursos tomam novos rumos. Há três anos, pelo menos, as universidades têm realizado alterações em seus currículos para se adaptar à nova realidade. Desde então, temas como administração e gestão de organizações e disciplinas práticas, que recorrem ao uso da tecnologia, tiveram seu espaço ampliado na grade de conteúdos. O mesmo ocorreu com a área de auditoria, visto que a audição dos negócios se configurou em mais uma tarefa a ser cumprida pelo contador.
O presidente da 6ª Seção Regional do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), Sérgio Fioravanti, acredita que ainda não terminou a fase de adaptação dos cursos às reformas que atingiram a profissão. Segundo ele, ainda restam outros nós a serem desatados no ensino da contabilidade. “Solidificar nas grades curriculares o atendimento a todos os mais de 40 pronunciamentos técnicos editados no País nos últimos dois anos é o próximo desafio para os coordenadores”, garante.
O atual panorama contábil também criou perspectivas para os cursos de extensão. As demandas recentes estimulam a busca por aperfeiçoamento profissional. No entanto, o contador com ambição de retornar ao ambiente acadêmico esbarra na carência de mestrados e doutorados ligados à área no País. Apenas a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) disponibiliza mestrado em Ciências Contábeis, no Estado. Esse cenário é amenizado, em parte, pela vasta oferta de pós-graduações.
Mesmo com as instituições de ensino adaptadas ao padrão internacional de normas, há quem alerte para a existência de um conflito entre a legislação e as resoluções do Conselho Federal de Contabilidade (CFC). “Alguns docentes não sabem o que dizer aos alunos. No momento em que as faculdades seguem à norma do conselho, os alunos vão perguntar ao professor se obedecem à lei ou a norma administrativa. A contabilidade está partindo para o campo da subjetividade”, lamenta Salézio Dagostim, especialista em finanças e professor da Escola Brasileira de Contabilidade (Ebracon).
Visão gerencial, adaptação à legislação vigente e uso de novas tecnologias. A Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) apostam nessa tríade para contemplar um perfil cada vez mais requisitado pelo mercado: o de contadores versáteis. Com a adoção do padrão internacional, em janeiro de 2008, as instituições passaram a trabalhar na formação de profissionais adaptados ao novo momento da contabilidade.
“Hoje, a função do contador está mais nobre. Aquele profissional que vinha com as Darfs para pagar e só gerava custo para a empresa está saindo do mercado e sendo substituído por um gestor da informação contábil, que faz análise de risco e sabe elaborar avaliações de patrimônio”, relata João Marcos da Rocha, coordenador da Comissão de Graduação em Ciências Contábeis e Atuariais (CGATU) da Ufrgs. Na faculdade, o ensino da contabilidade governamental e de temas ligados à Tecnologia da Informação (TI), como nota fiscal eletrônica, XBRL e o projeto Sped, fomentou a criação de novas disciplinas e a reestruturação de outras.
Na Pucrs, o processo de transição foi semelhante. A grade de conteúdos se voltou para os segmentos de controladoria e finanças. Neste ano, a graduação passará por uma revisão, visando a melhorias e modernização. “Passamos de uma contabilidade voltada ao fisco para uma contabilidade societária. Então, capacitamos o corpo docente de forma sistemática. Além disso, houve uma sinergia entre o mundo acadêmico e os profissionais de auditoria”, diz Saulo Armos, coordenador do curso de Ciências Contábeis. Um dos trunfos da universidade está na estrutura disponibilizada aos alunos, com 240 computadores e softwares para a realização de atividades práticas.
Ambas as universidades trabalham para preencher o déficit de cursos de extensão na área contábil no Estado. Recentemente, a Ufrgs acenou com a possibilidade de disponibilizar mestrado e doutorado. A ação seria viável a partir de uma aliança com duas universidades portuguesas e o Conselho Federal de Contabilidade (CFC). A proposta segue em compasso de espera devido a entraves burocráticos e estruturais.
Até 2014, a Ufrgs pretende desenvolver um mestrado próprio, sem a contribuição de parceiros. Para isso, trabalha na capacitação do corpo docente, visto que o grande empecilho para a realização de especializações está na carência de doutores na profissão. A Pucrs também conjetura a oferta de um mestrado. A expectativa é de que a primeira turma seja aberta daqui a três anos.
A Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) aposta na expansão do ensino a distância (EAD) para formar novos profissionais. A realização do curso de Ciências Contábeis nesses moldes nasceu de uma escuta de mercado realizada pela instituição, na qual ficou constatada essa necessidade. Oferecida desde o primeiro semestre de 2010, a graduação começa a ser disponibilizada nos polos de Caxias do Sul, Joinville e Porto Alegre neste ano. Anteriormente, ela era desenvolvida apenas em Canoas, Curitiba e Florianópolis.
As aulas são realizadas três vezes a cada sete dias, com cada disciplina tendo duração de nove semanas. Ao término desse período, o aluno faz a avaliação final em modo presencial, conforme dita as diretrizes do Ministério da Educação (MEC). Em todos os polos, a universidade tem parceiros responsáveis por uma estrutura física para a realização do exame. Todas as demais atividades, entretanto, ocorrem virtualmente. O material de apoio, as listas de exercícios e as videoaulas são desenvolvidos pelos docentes do curso presencial. A interação com os universitários e a correção de tarefas ficam a cargo dos professores tutores, contratados exclusivamente para desempenhar essas funções.
Os estudantes do EAD se encaixam, basicamente, em dois perfis: pessoas que retomaram os estudos em contabilidade após um período de interrupção e profissionais de outras áreas em busca de uma segunda formação. “Muitos alunos estão empregados e percebem que precisam desse conhecimento mais estratégico e técnico, pois ninguém na empresa em que ele trabalha possui essas características”, comenta Charline Pires, coordenadora do curso, que, somando todas as regiões, conta com 100 matriculados.
Charline destaca o fato de existir sintonia entre o currículo da graduação presencial e a distância. As cadeiras se equivalem em ambos os modelos. A última alteração realizada nos conteúdos programáticos foi feita após as mudanças no padrão de normas. Desde então, temas como contabilidade societária e contabilidade financeira ganharam maior destaque. Além disso, a gestão também ganhou uma abordagem diferenciada, abrangendo assuntos relacionados à administração estratégica e ao empreendedorismo.
A Unisinos permanece sendo a única universidade gaúcha a ministrar um mestrado na área. Com concentração em controladoria e finanças, as linhas de pesquisa da extensão acadêmica aludem à contabilidade para usuários externos, controle de gestão e finanças corporativas.
A Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI) ofertará, a partir do segundo semestre deste ano, mestrado em Gestão Estratégica de Organizações. Com duração de dois anos, a capacitação será conduzida no campus de Santo Ângelo da instituição. A investida no segmento de extensão foi motivada por um crescente interesse dos vestibulandos pelo curso de Ciências Contábeis, avaliado como o segundo melhor do Estado no último Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade). Em 2011, a procura pela graduação teve um aumento de 18%.
Para absorver as mudanças que a contabilidade vem passando, o currículo recebeu atualizações no início de 2008. Uma das preocupações da universidade se refere à formação de contadores com uma visão estratégica, possibilitando a atuação nos processos gerenciais. “Hoje, o profissional precisa ter uma visão maior e mais globalizada para conviver com as mudanças. Ele tem de saber que a contabilidade é muito mais ampla do que só fazer escrituração”, constata a coordenadora Neusa Salla.
Fonte: Jornal do Comércio / RS em http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=57056
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