As presunções de fraudes contábeis na legislação tributária
As fraudes contábeis podem ser provadas pela administração tributária por quaisquer meios lícitos e moralmente legítimos (Código de Processo Civil, artigo 369), uma vez que a legislação brasileira não limita ou pretende regular exaustivamente os meios de prova. Venosa (2003:549), ao citar clássica definição de Beviláqua, ensina que prova é o “o conjunto dos meios empregados para demonstrar, legalmente, a existência de um ato jurídico”.
Neste contexto, uma questão importante deve ser considerada na cobrança de tributos em decorrência da constatação de fraudes contábeis, pois a legislação tributária, via de regra, estabelece as situações em que a determinação do fato gerador do tributo será feita por meio do instituto da presunção, com o estabelecimento dos parâmetros para a determinação da base de cálculo do imposto que se presume sonegado.
Nesta direção leciona Campos (1995:16–18) quanto à relevância do instituto da presunção para efeitos de determinação do fato gerador da obrigação tributária
Entendemos ser presunção prova indireta, mas que não deixa de ser prova em sentido amplo, uma vez que sob o aspecto jurídico e moral constitui meio legítimo de produzir convencimento, que é a finalidade da prova. Inútil é pretender negar à presunção o caráter probatório. […]
É inadmissível aceitar-se a utilização de presunções sem expressa lei que as defina (princípio da legalidade), pois a criação de presunção pelo legislador é útil instrumento da arrecadação tributária. […]
A utilização da figura da presunção permite ao legislador enquadrar nas normas tributárias situações de vida econômica que sem o emprego deste instituto poderiam ficar excluídas, em prejuízo da igualdade das pessoas tributadas. (grifos nossos)
O Código de Processo Civil (Lei número 13.105/2015), no inciso IV do artigo 374, estabelece que não dependem de prova “os fatos em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade”.
Neste sentido, Silva e Cerqueira (2018: 172) esclarecem:
As presunções legais podem ser absolutas (iuris et de iuri) ou relativas (iuris tantum). A presunção absoluta é aquela que não admite prova em contrário; a lei presume fato como prova absoluta, como verdade indiscutível. A presunção relativa admite prova em contrário. O que ocorre na presunção relativa é uma inversão do ônus da prova: a presunção de que um determinado fato ocorreu subsiste, se não for produzida prova idônea em contrário pela pessoa contra a qual a presunção legal milita.
Na visão de Ferragut (2001:13) por meio da presunção legal se “(…) estabelecem como verdadeiro fato descritor de evento cuja ocorrência é indiretamente provada (…)”, tendo por objetivo “(…) suprir deficiências probatórias (…)” em razão do sujeito passivo da obrigação tributária praticar “(…) o ilícito de forma a dificultar a produção de provas diretas (…)”.
Tomemos como exemplo os dispositivos da Lei número 7.014/1996, a qual instituiu o ICMS no Estado da Bahia, no que dispõe os casos de presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto
Artigo 4º — Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
[…]
§4º O fato de a escrituração indicar saldo credor de caixa, suprimentos a caixa não comprovados ou a manutenção, no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a existência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declaração de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.
O fato de a Lei prescrever que ao contribuinte cabe a prova da improcedência da presunção não desobriga que os auditores fiscais, quando dos trabalhos de auditoria, apliquem extremo rigor na coleta das provas do cometimento do ilícito tributário presumido, em razão das evidências encontradas na escrituração contábil do sujeito passivo.
As presunções constantes na legislação baiana do ICMS são por natureza decorrentes da análise e identificação de determinados fatos verificados ao longo do processo de auditoria fiscal-contábil, cuja lógica é claramente apresentada por Barbosa (2004).
A presunção é o resultado de um processo mental, um processo lógico resultante da associação que se forma entre determinado fato conhecido – o fato-base – cuja existência é certa, e de um fato desconhecido, cuja existência é provável – o fato presumido – mas que tem relação direta com aquele.
Ora, o fato de constituir a consequência extraída de um processo mental segundo o qual a partir de um fato conhecido se conclui pela ocorrência de um outro fato, não demonstrado diretamente, não lhe retira a condição de meio de prova, mas de objeto de prova, que são os objetos materiais da prova.
Não podemos nos esquecer de que a escrituração contábil, produzida pelo contribuinte, uma vez admitida no processo de auditoria, seja por meio da entrega após regular intimação para apresentação ou nos casos em que a mesma foi objeto de apreensão por decisão judicial se constitui em prova contra o contribuinte.
Conforme apresentado por Melo (2011:213)
A presunção não deve manter atinência intrínseca aos aspectos estruturadores das normas de incidência, mas referir-se a elementos que possam conduzir à tipificação tributária.
A realidade da vida demonstra que sempre os fatos geradores encontram-se devidamente tipificados e documentados de modo a conferir segurança para a Fazenda e contribuintes/responsáveis no tocante à sua regularidade e exigibilidade. Nem sempre tais fatos encontram-se registrados, em razão de revelar-se imprecisa ou dificultosa sua configuração diante da infindável pie tora de atos normativos, ou mesmo em decorrência da própria sonegação tributária.
Da análise da legislação tributária de todos os Estados e do Distrito Federal é possível observar que há uma estreita similaridade nas tipificações dos casos de presunções relacionadas ao resultado da auditoria fisco-contábil. As pequenas divergências ficam por conta dos detalhamentos e desdobramentos das mesmas.
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