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Por Fernando Torres e Felipe Marques
Convidado para abrir um evento em São Paulo sobre o padrão contábil internacional, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, defendeu ontem em discurso o processo lento e paulatino de incorporação das IFRSs ao arcabouço regulatório dos bancos no Brasil. Para ele, antes de adotar uma nova norma, o BC "deve pensar no equilíbrio entre transparência e estabilidade do sistema, de modo que todos os impactos sejam meticulosamente analisados".
No mesmo evento, mas cerca de uma hora depois da partida de Tombini, o presidente do Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb), Hans Hoogervorst, se manifestou contrário a essa posição, bastante comum entre reguladores prudenciais. "Na verdade, a transparência é uma pré-condição para que haja estabilidade", disse ele ao Valor, logo após uma de suas apresentações na Conferência IFRS.
Ao falar sobre o registro de provisões contra inadimplência com base no modelo de perda esperada, que será adotado em breve no IFRS em substituição ao sistema de perda incorrida, Hoogervorst fez questão de marcar uma diferença entre a proposta do Iasb e as normas regulatórias prudenciais que exigem a constituição preventiva de reservas de capital elevadas já no momento da concessão de empréstimos. "Isso pode ser saudável para o sistema. Mas não é uma boa prática contábil", disse ele, ao enfatizar que esse tipo de contabilização não representa de forma adequada a performance das instituições.
Aqui no Brasil, a resolução 2.682 do Conselho Monetário Nacional (CMN) prevê que os bancos constituam provisões antes de qualquer evidência específica de que haverá inadimplência, o que pode ser considerado um modelo de perda esperada, embora não com as características que o Iasb defende. Os bancos locais dão uma nota de crédito ao tomador, que no momento da concessão pode ser 'AA', 'A', 'B' ou 'C' (quando há atraso efetivo a escala continua até 'H'). No rating 'AA', nenhuma provisão é feita. Já nas notas seguintes, o nível mínimo de provisão inicial é de 0,5%, 1% e 3%, respectivamente.
Sem mencionar especificamente o Brasil, o presidente do Iasb criticou também uma prática comum no país, que é a criação antecipada de um colchão de provisões quando os negócios vão bem para serem usadas no futuro, quando a carteira de empréstimos se deteriora, de modo a suavizar o lucro divulgado ao longo do tempo. "Assim, o investidor não sabe o que está ocorrendo", afirmou.
A solução proposta por Hoogervorst para esse ponto é que as reservas prudenciais continuem a ser constituídas, como desejam alguns bancos centrais, mas que não afetem a conta de lucros e prejuízos, somente o patrimônio.
De acordo com o presidente do Iasb, a preocupação dos reguladores e dos bancos com as normas contábeis mais baseadas em valor justo se deve ao fato de que as instituições financeiras estão trabalhando com "níveis muito baixos de capital, o que não permite que eles lidem com nenhuma volatilidade de mercado".
Em sua apresentação, Tombini disse que o Banco Central brasileiro tem acompanhado "com interesse" essa discussão sobre a mudança no sistema de reconhecimento de provisão para perdas em instrumentos financeiros.
"Esse assunto é de grande interesse de todos os reguladores prudenciais, pois afeta uma parcela considerável dos ativos dos bancos. O modelo atual, baseado nas perdas incorridas, não proporciona provisões em volumes suficientes e de forma tempestiva, o que ficou conhecido internacionalmente no jargão 'too little, too late' [muito pouco, muito tarde]."
Tanto o Iasb, que cuida do IFRS, como seu congênere Fasb, que regula as normas contábeis dos Estados Unidos, estão mudando as regras para constituição das provisões. Entretanto, cada órgão apresentou uma proposta distinta. A minuta da entidade americana defende o registro de toda a perda esperada para o ciclo de vida do empréstimo no momento da concessão do crédito. Já o modelo do Iasb propõe que a provisão inicial tenha como base apenas a probabilidade de perda num período de 12 meses. A reserva só seria elevada se houvesse algum gatilho sinalizando que houve uma deterioração na qualidade do crédito.
Segundo Hoogervorst, com as duas minutas em audiência pública, agora é o momento de ouvir o que os envolvidos com cada padrão contábil têm a dizer. "Ainda há espaço para as normas ficarem mais próximas", disse.
Fonte: Valor Econômico
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