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Poucas constituições no mundo são tão extensas quanto a brasileira: quase 65 mil palavras. Ela só perde para a da Índia e a da Nigéria, segundo estudo comparativo realizado em 2009 pela Universidade de Cambridge, Inglaterra. Se esse detalhamento pode ser explicado pela insegurança da sociedade brasileira, que em 1988 recém saíra da ditadura militar, o desejo dos constituintes de sacramentar o que podiam na Lei Maior resultou, segundo muitos analistas, em amarras e distorções. Algumas delas são apontadas por esses estudiosos como responsáveis por atravancar o crescimento do País até hoje.
Um exemplo de distorção comumente citado é o sistema tributário nacional, inscrito principalmente nos títulos VI, da Tributação e do Orçamento, e o VII, da Ordem Econômica e Financeira. O mínimo que se diz sobre as regras tributárias é que compõem um sistema “obsoleto”.
A avaliação mais recente sobre a sua funcionalidade, feita por um grupo de trabalho da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE), em outubro, fala de sua obsolescência e classifica-o como “complexo, regressivo, anticompetitivo, antiemprego, responsável por desequilíbrios federativos”. Desde 2003, a Emenda Constitucional 42 incluiu entre as competências do Senado a de avaliar periodicamente não só se o sistema é funcional, mas também a quantas anda o desempenho das administrações tributárias da União, dos estados, dos municípios e do Distrito Federal.
Baseada em um relatório do Banco Mundial do ano passado, a CAE ressalta que o Brasil é considerado o campeão mundial nos custos de compliance, aqueles que as empresas são obrigadas a bancar para atender as exigências da legislação tributária. Os empresários brasileiros gastam 2.038 horas por ano para atender o cipoal tributário em que se transformou o sistema nacional.
Os mais próximos de enfrentar os mesmos entraves são os sistemas da Bolívia, onde as empresas gastam 1.025 horas com mesmo fim, e da Venezuela, que compromete 792 horas das empresas. O Paraguai, que tem atraído muitas companhias brasileiras, exige apenas 378 horas por ano no cumprimento de exigências tributárias.
Além da complexidade e do excesso de normas, o Brasil também é conhecido internacionalmente por ostentar uma carga tributária pesada em comparação com economias semelhantes. Dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que esse peso para os brasileiros correspondia a 33,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014. Enquanto os mexicanos arcavam com apenas 19,5% e os chilenos, cuja economia é considerada a mais ajustada da América do Sul, contribuíam com 19,8% do seu PIB.
Um problema adicional é a distribuição da carga. Como a incidência maior é sobre o consumo de bens e serviços, os brasileiros de menor renda arcam com o peso maior dos tributos indiretos. O principal deles é o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), estadual. Enquanto isso, os brasileiros de maior renda sentem menos o peso dessa tributação indireta. Isso no jargão tributário é chamado de regressividade.
Com base em um estudo premiado pelo Tesouro Nacional, o coordenador do grupo de trabalho da CAE, senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), ressalta que a faixa mais pobre da população paga duas vezes mais tributos do que as mais ricas, na proporção com a renda de cada faixa.
Pendências - Outro efeito do texto constitucional foi acabar exigindo constantes manifestações do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a constitucionalidade das leis tributárias. Levantamento da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados mostrou que, até o início de fevereiro deste ano, 11,51% dos processos em tramitação no STF estavam relacionados a direito tributário, só atrás dos pleitos sobre matéria administrativa (37,6%) e direito penal (12,52%). Dos 56 enunciados da Súmula Vinculante, 23,2% são de direito tributário.
O montante em discussão no STF atinge cerca de R$ 600 bilhões, incluindo tributos previdenciários, segundo o Anexo de Riscos Fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2018. Mas a estimativa do contencioso tributário nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal) é muito maior.
Segundo o relatório da CAE, esse contencioso alcançava R$ 4,08 trilhões em 2016, correspondendo a 66% do PIB brasileiro. O excesso de litígios, acrescenta o texto, envolvendo principalmente empresas e o fisco, causa uma insegurança jurídica que desestimula os investimentos.
Além disso, no caso do Supremo, leva a mudanças constitucionais caso a caso e nem sempre eficazes, sobrecarregando ainda mais a Carta de 1988. O especialista em direito tributário e tributação da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva, diz que o Congresso faz alterações pontuais e derivadas de reações a decisões do Supremo.
No estudo que desenvolveu com outro consultor da Câmara, José Araújo, sobre os 30 anos do sistema tributário nacional pós 1988, Silva lembra que a ampla competência do STF em matéria tributária levou por diversas vezes a uma rota de colisão com a política fiscal do governo. O Congresso teve de agir para mudar a Constituição e leis, como forma de superar ou contornar entendimentos da Suprema Corte, diz ele.
Um dos exemplos citados no estudo foi o da instituição, por muitos municípios, de taxas para arcar com as despesas com a iluminação pública. O Supremo entendeu que essa remuneração não poderia ser feita por meio de taxa e, sim, mediante cobrança de imposto, conforme enunciado 41 da Súmula Vinculante do STF.
Para suprir a deficiência provocada nos cofres municipais, o Congresso mudou a Constituição, com a Emenda 39, de 2002, criando uma nova modalidade de contribuição, a Cosip, destinada ao serviço de iluminação pública. Em julgamento posterior, o STF reconheceu a constitucionalidade da nova contribuição. As informações são da Agência Senado.
http://diariodocomercio.com.br/noticia.php?tit=sistema_tribut%EF%BF...
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