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Câmara pode elevar ICMS na conta de luz
Projeto de Lei que impõe a tributação de ICMS em todas as fases do setor elétrico pode ser votado na terça-feira
Setor elétrico lança vigília para barrar iniciativa; líderes do PT e do PSDB dizem à Folha que tema será retirado
AGNALDO BRITO
DE SÃO PAULO
Um acordo de líderes partidários na Câmara dos Deputados ameaça levar a votação na próxima terça-feira o PLP 352/2002 a partir do qual, pelo texto atual, muda a forma de cobrança de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre energia elétrica.
A medida faria parte da agenda apresentada pelos novos governadores para obtenção de mais recursos para o caixa dos Estados.
Pelo texto, o ICMS passará a ser cobrado em todas as fases do setor elétrico, da produção da energia na usina, passando pela transmissão e comercialização, até o consumidor final. Hoje, o tributo, com o qual os 27 estados arrecadam R$ 23 bilhões por ano, incide apenas na conta de luz.
PROMESSA
Os líderes do PSDB (João Almeida-BA) e PT (Cândido Vaccarezza-SP) na Câmara dos Deputados afirmaram à Folha que esse dispositivo do projeto de lei será retirado e substituído por outra emenda na terça-feira, quando o PLP irá a votação após aprovação do regime de urgência.
Segundo os dois parlamentares, no lugar da proposta entrará uma emenda que posterga por dez anos o direito ao crédito de ICMS por estabelecimentos que utilizem bens e insumos como energia elétrica e serviços de comunicação.
Pela Lei Kandir (Lei Complementar 87, de 13 de setembro de 1996), os estados teriam de conceder esse crédito a partir de janeiro de 2011, o que representaria novas desonerações e redução da arrecadação para os Estados.
Embora os líderes prometam não mexer na forma de tributação do ICMS na energia elétrica, a medida substitutiva não deixa de também retirar um direito dos consumidores.
MOBILIZAÇÃO
Mas mesmo com a promessa dos líderes de não votar a mudança, as associações de consumidores e produtores de energia elétrica decidiram manter a mobilização contrária a qualquer alteração. Uma reunião entre associações do setor elétrico com sede em Brasília está marcada para esta segunda.
A Folha apurou que gestões junto ao governo já foram iniciadas. Procurado, o Ministério de Minas e Energia informou, por meio de sua assessoria de comunicação, que está acompanhando o assunto, mas não irá se pronunciar "até a sanção presidencial".
Segundo o presidente da Abiape (Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia), Mário Menel, a tramitação rápida do PLP 352/2002 pegou o setor elétrico de surpresa.
A avaliação preliminar das entidades (Apine, Abraceel, Abragel e Abrace) é a de que, se for aprovada, a lei vai elevar a carga tributária sobre o consumo de energia elétrica.
Segundo levantamento do Instituto Acende Brasil, a carga tributária consolidada sobre o setor elétrico brasileiro é de 45,08%.
"Ainda não sabemos o impacto, mas é certo que ao aplicar o ICMS em todas as fases da cadeia o resultado será o aumento de carga. Isso é mais um ato contra a competitividade", diz. Menel afirma que as entidades tentarão calcular esse impacto antes da eventual votação.
O QUE PODE MUDAR
NO TRIBUTO ICMS
COMO É HOJE
A alíquota de ICMS, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, é aplicada sobre o consumo e quem paga é o consumidor final
COMO PODE FICAR
Caso o projeto seja votado, aprovado e sancionado, o ICMS passaria a ser aplicado em todas as fases do setor elétrico, da produção da energia na usina, passando por transmissão, comercialização, distribuição e consumo final. Agentes do setor afirmam que a mudança implicará aumento da carga tributária sobre eletricidade
QUANTO SE ARRECADA
Os 27 estados arrecadam R$ 23 bilhões em ICMS sobre a conta de luz, cerca de 10% de toda a arrecadação com esse tributo no país. O ICMS é a principal receita dos Estados
ANÁLISE
Pela transparência e eficiência dos impostos na conta de luz
CLAUDIO SALES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Difícil acreditar, mas, ao longo de décadas, foram embutidos na tarifa de eletricidade 23 tipos de impostos e 13 tipos de encargos por iniciativa dos poderes Executivo e Legislativo, representantes do povo brasileiro.
São 36 rubricas -desde as mais "clássicas", como PIS/ Cofins e ICMS, até as menos conhecidas, como a RGR [usado pelo Luz para Todos], a CCC [que custeia a térmicas na Amazônia] e o ESS [que banca a geração térmica para economia de água nas hidrelétricas].
Todas demonstram que a tributação sobre a energia elétrica nunca foi baseada em princípios de eficiência e de transparência.
Há múltiplos tributos para os mesmos fatos geradores e bases de cálculo. Há múltiplos encargos para a mesma finalidade. Recursos de encargos são aplicados para objetivos outros que os de suas finalidades originais. Todos cobrados de forma indireta e camuflada na conta de luz.
O resultado desta prática foi uma brutal sobretributação do setor elétrico: a carga tributária sobre a conta de luz é de 45%, enquanto que a carga tributária sobre a economia como um todo é de 35%.
A sobretributação sobre o setor elétrico acontece porque os "representantes do povo brasileiro" sabem que a energia elétrica, serviço universalizado e de ampla base de arrecadação, permite coletar muitos recursos de maneira dispersa e pouco visível, despertando pouca ou nenhuma resistência dos contribuintes. Afinal, quantos consumidores sabem que terão pago mais de R$ 45 bilhões em tributos e encargos na conta de luz em 2010?
Mas há alternativas simples e rápidas para diminuir a tributação sobre o setor elétrico. Merecem destaque duas propostas: 1) Reduzir as alíquotas de PIS/Cofins sobre a conta de luz; 2) Cumprir a lei e acabar com a cobrança, em 31 de dezembro de 2010, da RGR (Reserva Global de Reversão), um encargo criado em 1957 e que perdeu a razão de existir.
Esse é o momento ideal para implementar tais propostas. Em outubro, a presidente eleita deu a seguinte declaração: "Estou assumindo um compromisso de redução inclusive no sentido de zerar, tanto o PIS/Cofins de energia, como o de transporte e o de saneamento".
Compromisso assumido.
Se for cumprido, ganharão todos os brasileiros cansados de ver sua conta de luz funcionar como guichê arrecadador de impostos.
CLAUDIO J. D. SALES é presidente do Instituto Acende Brasil (www.acendebrasil.com.br)
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